DESTRUIÇÃO EM BENGUELA MORTE E SOBREVIVÊNCIA
Somos todos culpados pela actual
crise nacional? Era o que faltava!
Assistimos diariamente à prepotência, o desprezo, a
negligência e o populismo com que os políticos e governantes ditam as regras
que mexem no erário público, com justificações ridículas, que visam equilibrar
uma instabilidade criada pelas más políticas, que há vários anos tem sido a sua
base de intervenção. A preocupação dos governantes angolanos é sustentar uma
infinidade de serviços, projectos e programas, muitos deles sem qualquer
utilidade pública, mas que a seu bel-prazer promovem carreiras e fortunas aos
amigos. Sabemos que para alguns
políticos, as verdades nunca são absolutas e mudam consoante as necessidades. O
povo, que constitui o rebanho os eleitores, são apenas figurantes de que os
políticos se servem para atingir os seus projectos pessoais. Como faz falta a
Angola uma entidade de consenso e acima de qualquer suspeita que, atribua responsabilidades
aos seus governantes e, os , a pagar pela situação por eles criada no país.
Não digam que a população de Angola não tem o direito
de saber onde são gastos os dinheiros da maior fonte de rendimento do país e as
contribuições obrigatórias.
Nas outras latitudes, a população tem acesso a todos
os gastos do Estado e, podem consultar as despesas de ministros e assessores.
Porém, desafio o poder central para que faça o mesmo em Angola. A isto sim,
chamaria “coragem política”. Mais do que nunca é hora de sermos audazes e
reprovarmos a política de gestão do país, que não poupa nem atenua a miséria e
o sofrimento deste espezinhado povo, da situação da qual está submetido. O que fica no que muda.
A enxurrada caiu dos morros, zonas consideradas de risco,
que abalou o mundo, Angola e em particular Benguela.
O povo de Benguela e em
particular do Lobito quer a cabeça de Amaro Segunda, administrador do município
do Lobito e acusa-o de assassino, potencial responsável pela grande tragédia
que se abateu sobre o Lobito, fundamentalmente nas zonas de risco. A ganância
exagerada pelo dinheiro (venda de terrenos) levou-o conscientemente a ignorar,
permitindo que os vasos comunicantes das valas de drenagens do P.D.I.C –
Projecto de Desenvolvimento Industrial da Catumbela e outras, fossem obstruídas
para facilitar o assentamento de novos inquilinos. A preocupação com os
terrenos que dão muito bom dinheiro tem sido tão grande que o projecto 1000 m2
para cada cidadão para fins habitacionais de Isaac dos Anjos, tem sido de certa
maneira ignorado ou implementado de animo leve. Isaac dos Anjos, governador da
Província de Benguela, há um tempo a esta parte, orientou expressamente o
administrador do Lobito para a necessidade urgente de retirar toda a população
das zonas de risco. O que não aconteceu. Pois as preocupações para este
administrador, de momento, são outras. E os resultados estão aqui bem visíveis
como resultante de uma ausência gritante de poder.
No entanto, importa aqui salientar que, transferir os
moradores das zonas de risco para áreas longínquas, distantes do seu mercado de
trabalho, sem saneamento básico, água e luz, com apenas meia dúzia de chapas e
tijolos, não é nada político e constitui um autêntico atentado a dignidade
humana. Na verdade, os espaços dignos são reservados para negociatas e negócios
deles. Como é óbvio os moradores voltarão a precedência ou ocupar outros
espaços com semelhantes riscos.
Onde estão as centralidades, nada dignificantes para
os moradores de baixa renda? Mais uma vez, o lema é baralhar e voltar a dar aos mesmos.
A população de Angola só quer actos de e com
responsabilidades e respeito pela sua dignidade como tal, - angolana, cidadã e eleitoral.
Benguela, na quarta-feira, dia 11 de março de 2015,
foi arrancada à normalidade e colocada perante a morte. A morte individual e a
morte de tudo: “parecia o fim do mundo”.
“Dezenas de pessoas foram levadas
pela água. Júlio, no meio da torrencial chuvada que abateu sobre o Lobito disse
à mulher e aos filhos para saírem do carro – foram arrastados e até o momento,
não sabe deles. Kudy viu passar casas inteiras, carros e frigoríficos nas
enxurradas”.
Uma situação como as dos dias 11 e 12 no Lobito poderá
ocorrer uma vez mais nós próximos tempos. Mas a situação excepcional de chuvas
foi agravada pela ocupação irregular do terreno e pelo solo tornado permeável
pela deflorestação e aterros anárquicos dos mangais, numa febre louca de
acumulação primitiva de capital, levada a cabo por figuras com
responsabilidades acrescidas.
As ribeiras dos bairros Liro, Alto Liro, Acongo, 4 de
Abril, São João, toda zona da Santa-Cruz, Belavista e Boavista, nascem nos
morros que dominam o Lobito e, por conseguinte, levaram com todas as cargas de
água.
A mistura de rochas, lama e água a alta velocidade,
fê-las transbordar, rebentar os canais que as contêm e inundar a baixa do
Lobito.
Nos últimos anos, no mandato de Amaro Segunda tem havido muitas críticas ao ordenamento do
município do Lobito e ao licenciamento de construções próximas do leito das
ribeiras e aos aterros abusivos dos mangais impedindo a livre circulação da sua
água.
Amaro Segunda administrador do município do Lobito, não obstante,
recusar responsabilidades, manifestou estar preocupado com a imagem do Lobito
no mundo, pois está com a cabeça a prémio.
Foi uma grande tragédia que deixaria um incalculável
número de desalojados e teria matado, segundo dados oficiais, mais de 72
pessoas, das quais 40 crianças e muitos danos materiais. No entanto, ainda há
muitos corpos por recolher e encontrar no Lobito. Todavia, os lobitangas do
morro, atingidos por está grande tragédia só têm uma terra. Só têm uma casa. Só
têm um lar.
Ninguém sugere que se forje uma “unidade Nacional”
forçada, ou que se branqueiem escândalos do momento. O que é preciso é que a Proteção
Civil e Bombeiros se equipe, e faça formação para funções de intervenção em
catástrofe, ou ajuda num ambiente de risco. O governo central e os seus
ministros presentes, e o governo da província de Benguela, que se mobilizem
perante o desafio, mostrando que, perante a presente calamidade pública,
conseguiram minimizar perdas e danos. Será? Houve sim, muita palhaçada, muito
aproveitamento e, como se não bastasse, dos políticos, dos governantes, de
supostas organizações sociais, das empresas e entidades individuais
descapitalizadas pela crise imposta por eles. Onde está o Fundo Soberano?
criado para colmatar as eventuais crises financeiras e calamidades? A
oligarquia fez a festa. Porém, ainda há gente “graúda” que encima da tragédia vai “comer”.
Sem obras que duraram anos a fazer, sem planeamento
que tomou décadas, podíamos hoje ter muito mais mortos, a razia da economia
local, o fim do Lobito e o regresso aos mangais.
Mas enquanto o mundo não acaba,
temos de recomeçar.
Desde logo, porque haverá mais, e
pode ser pior.
Francisco Rasgado
Jornal ChelaPress
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